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Quando eu era menino pequeno lá em Retiro do Muriaé, quase ninguém pronunciava alguns dos nomes de Satã. Além do medo que nos fora impresso pela cultura cristã de atrair o Capeta, os designativos de Satanás eram todos considerados palavrões que só os meninos mal educados ousavam xingar. As pessoas mais velhas, ao precisarem falar o nome do Bicho Ruim, usavam o qualificativo “inimigo”. Então, diziam que o Inimigo tentou fulano de tal, por isso ele matara sicrano ou beltrano, ou roubara alguma coisa, ou teria tido um comportamento inconveniente qualquer. E depois, esconjuravam-se e persignavam-se como para se livrarem de ter atraído o Tinhoso ao pensarem nele ou ao proferirem seu apelido. Naquele tempo, o povo atribuía a qualquer atitude humana fora dos padrões sociais a uma tentação do Príncipe das Trevas. Nos casos mais graves, de repetidas safadezas, dizia-se que o indivíduo estava endemoninhado, possuído por Lúcifer; só um exorcista poderia dar jeito. Era a crença romântica de que toda criatura nasce boa, que o batismo a torna ainda melhor e a conversão, definitivamente, a faz santa. Uma forma de eximir a todos da responsabilidade por seus atos, atribuindo-os a alguma inexorável força alienígena.
Mesmo hoje, quando a sociedade avança na compreensão da natureza humana e da organização social, há espaço para reduzir tudo à eterna disputa entre Deus e o Diabo, entre o bem e o mal. O corpo social brasileiro é majoritariamente mítico por força de uma colonização de base cristã. Aliás, essa mistura mística e de raças, que faz a originalidade do nosso povo, leva-nos a uma percepção da realidade quase sempre opaca. É como diria Roberto Campos – por quem nunca tive simpatia -, o brasileiro é a mistura da cultura do privilégio, com a da magia, com a da indolência. Eu diria que é por isso que nos impingimos e aceitamos axiomas como “o brasileiro tem memória curta”, “daqui a pouco já ninguém se lembra disto” e outros.
A manter a crença de que o país é o centro da disputa entre Deus e o Pai da Mentira, o campeonato já está praticamente perdido pela agremiação celeste. Ainda mais depois desses últimos jogos em que o senado brasileiro vem vencendo todas por W.O. Deus do céu! Claro que sei não haver nenhum santo lá no Congresso Nacional - viu o Pedro Simon tremendo sob as ameaças de Collor? Afinal, terem um Conselho de Ética e Decoro Parlamentar - já há projeto para acabar com o CEDP, não se precisa mais - é só outra das enganações do Tinhoso. São as más influências do Demônio que têm feito o presidente do senado, que também é imortal, negar o inegável, certamente. Ele é um bicho atentado. Tenho uma colega de trabalho que, diante da tragicomédia dos ditos e desditos, acha que o Sarney está ficando doido; esta é uma outra forma de dizer que a culpa não é dele; também, com uma biografia daquelas...
Mas, chegue o ouvido aqui, mais perto: o que está acontecendo com o atendimento dos postos de saúde em Itaperuna? Parece que erram todos os diagnósticos. Quem autorizou o assassinato de uma árvore de 26 anos que dava uma bela sombra na praça central de Itajara? As saúvas disseram que a danada jogava muita folha no chão; que lhes davam bastante trabalho pra varrer. Hum! quem tá vencendo o jogo por aqui?!
Lembro-me do Macunaíma, de Mário de Andrade, trepado num caixote dizendo que os males do Brasil - e de Itaperuna, portanto! - é “pouca saúde e muita saúva". Mas, a culpa... deve ser do Diabo, é claro!
Fonte:http://professorzeluiz.blogspot.com/ e Revista Stilo Off Setembro/ 2009
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2 comentários:
Há gente que gosta de elogios... eu sou destes. Por isso muito obrigado por lerem minhas divagações sobre coisas e pessoas.
Nós que devemos agradecer por nos beneficiar com leitura tão agradável e informativa, além do privilégio de ter seus textos para enriquecimento de nosso blog.
Muito obrigado Professor José Luiz!
Marco Antonio(Outra Revista)
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